Autoridade monetária restringe comunicados sobre o ritmo da atividade para evitar a interferência do Planalto nos juros
DECO BANCILLON
Os constantes ruídos na comunicação oficial da equipe econômica da presidente Dilma Rousseff entraram de vez na pauta de preocupações do governo. Após as inúmeras divergências entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central sobre temas sensíveis, como o esforço fiscal mínimo e a taxa básica de juros (Selic), ficou decidido que, a partir de agora, os comunicados da autoridade monetária serão mais seletivos. O primeiro exemplo dessa maior austeridade nos posicionamentos foi visto na última terça-feira.
Após o decepcionante resultado do Produto Interno Bruto (PIB), com queda de 0,5% no terceiro trimestre, o mercado aguardou que o presidente do BC, Alexandre Tombini, emitisse algum sinal a respeito do número que provocou alvoroço no Palácio do Planalto. A espera foi em vão. O silêncio ensurdecedor marcou uma nova era para o órgão. A partir de agora, o BC só se manifestará sobre o resultado fechado do PIB.
A decisão, informou a instituição, nada tem a ver com o decepcionante número registrado entre julho e setembro. Ao Correio, a autoridade monetária explicou que já não vinha se pronunciando sobre resultados trimestrais.
A justificativa, porém, foi a proximidade dos resultados do PIB com o calendário de reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), responsável por discutir alterações na taxa básica de juros (Selic).
Hoje, sairá a ata da reunião que decidiu pela elevação dos juros básicos para 10%. O documento trará as avaliações do BC sobre a economia brasileira e internacional. Dessa forma, não havia necessidade de emitir, na terça-feira, posicionamento sobre um dado que seria comentado na ata.
O órgão esqueceu de dizer, porém, que, no dia 16 de julho, o presidente do BC, Alexandre Tombini, comentou, em audiência no Senado, que, após a alta de 0,6% do PIB no primeiro trimestre do ano (dado posteriormente revisado para variação zero), tudo levava a crer que haveria continuidade dessa expansão nos meses seguintes.
No dia 4 de outubro, durante palestra a investidores em Londres, na Inglaterra, Tombini arriscou palpite para o desempenho do terceiro trimestre. Deu a entender que o resultado do PIB no período seria “mais benigno do que as pessoas estão esperando”. Não foi. Mas nem Tombini, nem o BC quiseram explicar por que erraram nas previsões.
Entre técnicos da instituição, os argumentos são de que o silêncio auto-imposto pelo BC tem a ver com o temor de uma nova intervenção do Planalto na política monetária. No ano passado, a presidente Dilma Rousseff determinou que a taxa Selic fosse reduzida ao menor patamar da história, a 7,25% ao ano, apesar da inflação em disparada. A credibilidade do Banco Central ruiu. Agora, na tentativa de reconstruir a confiança, a instituição decidiu ficar fora do debate sobre o crescimento minguado, para evitar que o governo se ache no direito de novamente controlar os juros.
E EU COM ISSO
A transparência do pensamento do Banco Central é vital para a credibilidade da política monetária. Quanto mais a sociedade confiar no compromisso real da instituição em seguir à risca suas missões, a principal delas, preservar o valor da moeda, mais efetivos serão os resultados. Um BC que atua nas sombras prejudica o andamento da economia, pois estimula os formadores de preços a imporem custos pesados às famílias e às empresas, por meio de reajustes exagerados. No caso do BC, transparência tem tudo a ver com autonomia.
Fonte: Correio Braziliense