Por Antonio Perez, Angela Bittencourt e Lucinda Pinto | De São Paulo
O Banco Central (BC) dobrou o mercado e desinflou as apostas em uma alta expressiva da taxa básica este ano. A tese do choque de juros, acalentada por alguns em meio a turbulências nos emergentes, não só saiu do radar como deu lugar à perspectiva de uma moderação no ritmo de aperto monetário. E isso tudo em apenas pouco mais de duas semanas. No início de fevereiro, a curva de juros futuros chegou a espelhar chances de 30% de alta de 0,75 ponto percentual este mês e projetar taxa básica Selic em 14% em dezembro. Agora, as tesourarias põem a maior parte de suas fichas em uma alta de 0,25 ponto nesta semana e taxa básica abaixo de 12% em dezembro.
E, a julgar pelo que projetam analistas, em um raro consenso com as tesourarias, desta vez não há elementos que impeçam o Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir o passo. O Valor consultou 43 economistas de bancos e consultorias e mais de 70% da amostra (31) espera aumento da Selic em 0,25 ponto nesta semana. Para 12 entrevistados, a possibilidade de o juro avançar mais 0,50 ponto este mês, para 11% ao ano, não está descartada. Deste elenco de 43 profissionais, 12 trabalham com a perspectiva de manutenção em 10,75% entre fevereiro e janeiro de 2015.
Para analistas, sobram motivos para apostar em alta menor da Selic. Passado o vendaval externo que abalou as moedas emergentes, não se vê depreciação aguda do real na próxima esquina. Depois do susto do IPCA de dezembro, a inflação perdeu um pouco de força. E uma tríade de indicadores de dezembro – produção industrial, vendas no varejo e o Índice de Atividade do BC (IBC-Br) – mostrar que a economia fraqueja.
Com essas peças já no tabuleiro das expectativas, o presidente do BC, Alexandre Tombini, em entrevista a jornalistas estrangeiros, no dia 18, disse que a inflação caminha para a meta e que a política monetária já surte efeitos. Para compor o quadro da diminuição do ritmo de aperto faltava apenas uma peça: a política fiscal. E ela foi posta no tabuleiro pelo governo no dia 20, com anúncio de uma meta de superávit primário de 1,9% do PIB para este ano – ou seja, um esforço idêntico ao realizado em 2013.
De repente, a tão criticada suposição do BC de que o impulso fiscal será neutro se tornou verossímil aos olhos céticos de tesourarias e economistas. “O pronunciamento do Tombini já havia sinalizado disposição de reduzir o ritmo de alta da Selic. O anúncio fiscal deve sacramentar esta decisão”, afirma Solange Srour, economista da ARX Investimentos.
Solange ressalta que o sinal de uma política fiscal mais austera é muito importante para o BC, que já contava com um impulso fiscal neutro faz algum tempo, embora “a realidade dos fatos” não corroborasse essa hipótese. A economista alinha-se ao grupo que espera uma alta de 0,25 ponto da Selic nesta semana. Por ora, Solange mantém projeção de outra elevação de 0,25 ponto em abril, com a taxa básica chegando a 11% no fim do atual ciclo de aperto.
Mas com os cortes de gastos, a economia fraca e o comportamento atual da taxa de câmbio, é grande “a probabilidade de o BC já sinalizar em seu comunicado” que vai monitorar os dados para decidir o que fazer em abril. “Se as expectativa para o PIB no primeiro trimestre apontarem um número fraco, próximo de zero, acho que há chances significativas de o BC não subir os juros em abril e encerrar o ciclo com a Selic em 10,75%”, afirma.
O economista da Icap Brasil, Juliano Ferreira, vai pela mesma linha e vê a Selic atingindo 11% este ano, sem descartar, contudo, a possibilidade de que o Copom decrete o fim do aperto monetário. “Estava com 0,50 ponto, mas os últimos números de inflação, atividade e a meta fiscal me levaram a acreditar que o 0,25 ponto é a alternativa para um BC que quer parar de subir os juros logo”, afirma Ferreira. “Temos que ver o IPCA de fevereiro, mas aumentaram as chances de que o BC pare agora.”
Para Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Simplific Pavarini, o BC não vai apenas diminuir o passo como encerrar o ciclo de alta esta semana. Grande parte do esforço monetário, diz o economista, “já foi feito e vem dando relativamente certo, já que o IPCA deve fechar este ano abaixo de 2013, quando subiu 5,91%. “Todo aperto monetário tem uma defasagem, leva em torno de 10 e 12 meses para surtir os efeitos pretendidos. É preciso parar agora para reavaliar”, afirma.
Desde que iniciou o atual ciclo de aperto, em abril do ano passado, o BC já elevou a Selic em 3,25 pontos percentuais. A taxa de juro real, que à época rodava na casa de 2%, superou 5%. Trata-se de um tremendo esforço monetário. Mesmo assim, as expectativas de inflação teimam em se manter próximas de 6% – ou seja, mais perto do teto (6,5%) que do centro da meta (4,5%). Daí que não se pode acusar de descabida a hipótese – perfilhada por parte dos analistas ouvidos pelo Valor – de que o BC volte a apertar o torniquete monetário após as eleições de outubro.
Solange, da ARX, vê como muito provável uma alta de 0,50 ponto da Selic no último encontro do Copom este ano, em 2 e 3 de dezembro. Como a inflação estará rodando em um patamar alto no final deste ano, diz a economista, “faz sentido” o BC subir os juros para combater os efeitos secundários da “herança maldita da inflação represada” e tentar trazer as expectativas de 2015 e 2016 para um patamar mais próximo do centro da meta.
Paulo Vieira da Cunha, da ICE Canyon, acredita que “certamente a Selic volta a subir após as eleições”. Já para o rumo da Selic em 2015, Cunha, ex-diretor de assuntos internacionais do BC, traça dois cenários. Se houver uma mudança da gestão da política macroeconômica, com um forte ajuste fiscal, a Selic vai a 12% e começa a ser reduzida a partir de meados do próximo ano, terminando 2015 a 9%. Mas se houver uma “indefinição da política macro”, o próprio mercado forçara um ajuste, “levando a disparada da Selic”.
Fonte: Valor Econômico