Por Roberta Costa | De São Paulo
O tema do teto da dívida dos EUA, se ainda não ganhou peso maior nos debates do mercado financeiro, deve dominar as análises nos próximos dias. Nesta semana, o secretário do Tesouro americano, Jacob Lew, foi enfático ao comunicar ao presidente da Câmara dos Deputados, John Boehner, que no dia 17 de outubro o teto de US$ 16,7 trilhões será alcançado e que, neste momento, apenas US$ 30 bilhões estarão em caixa.
Na verdade, o limite foi alcançado em maio, mas dispositivos especiais foram usados de modo a permitir o financiamento do governo desde então.
De fato, o risco de não cumprimento das obrigações financeiras pelo governo americano tecnicamente existe. Aliás, sempre existiu já que este dispositivo – a aprovação global para todos os empréstimos pelo Congresso – foi criado em 1917. De lá para cá, mais de uma centena de vezes houve a necessidade de elevar o teto, sendo que desde 1960, segundo levantamento da rede americana CNBC, o Congresso atuou 78 vezes para aumentar permanentemente, prolongar temporariamente ou rever a definição do limite da dívida.
Mas o emblemático embate de agosto de 2011 ainda é bastante vivo na memória dos investidores. Naquele momento, o imbróglio político era elevar o teto de US$ 14,3 trilhões para o atual nível (cerca de 120% do PIB). A demora nas negociações redundou em um “downgrade” histórico da dívida soberana americana (de “AAA” para “AA+”). Não foi pouca coisa, considerando o cenário econômico difícil desde a crise em 2008.
Ainda que este risco advindo de uma batalha no Congresso seja perene, pouco se viu de reações preocupantes nos ativos nos últimos dias, porque há sempre a avaliação de que “no fim tudo dá certo”. Entretanto, há sinais que devem ser monitorados, como dizem os estrategistas do HSBC, Gareth Berry e Geoffrey Yu, em relatório que analisa o tema.
Segundo eles, mesmo que os investidores se lembrem de que em agosto de 2011 a situação foi resolvida, “não é hora de complacência, dados os severos movimentos de mercado antes e depois do rebaixamento da dívida”.
Como exemplo da forma que o mercado “levou a sério o risco de default técnico” dos EUA na época, o “yield” (retorno) da T-Bill de seis meses com maturidade em agosto de 2011 começou a subir fortemente duas semanas antes do prazo crucial (de dois pontos-base para 26 pontos-base). Por isso, dizem os estrategistas, “estamos acompanhando o vencimento da T-Bill com maturidade em 24 de outubro cuidadosamente como um indicador de alerta precoce de preocupação crescente”.
Ou seja, mesmo que “a reação do mercado tenha sido relativamente calma até agora, isso pode mudar logo”, a menos, claro, que sinais de progresso nas negociações avancem rápido. Aliás, um sinal de preocupação do mercado que chama atenção se fez mais claro ontem: a alta de 4,5% do CDS (“credit default swap”, espécie de seguro contra calote) americano de cinco anos, para 30,66 pontos, o maior nível desde maio, antes da sinalização da redução dos estímulos monetários pelo Fed.
Do ponto de vista das ações, os estrategistas veem o fechamento em queda nas últimas sessões (ontem as bolsas subiram nos EUA) como dentro do padrão visto em agosto de 2011 e “durante a contagem regressiva tanto para o abismo fiscal em 1º de janeiro como do sequestro fiscal em 1º de março de 2013”. A reação do dólar a uma escalada de preocupação é provavelmente mais confusa com os investidores tentando conciliar o refúgio tradicional da moeda americana com o fato de os EUA serem a fonte do problema, avaliam.
Outro ponto curioso é a discussão da questão fiscal como justificativa mais forte para que o início da redução de compras de ativos pelo Fed seja postergado. Para o Citi, o Fed poderia começar a agir em dezembro e só terminar o programa em setembro de 2014.
Fonte: Valor Econômico