Câmbio pesa mais para diminuir endividamento do que esforço fiscal do governo
MarthaBeck
BRASÍLIA- A alta do dólar preocupa o governo quando o assunto é inflação, mas tem dado uma ajuda importante na área fiscal. Graças à recente valorização da moeda americana, a dívida líquida do setor público reforçou sua trajetória de queda. Os dados do Banco Central mostram que, até julho, o cambio contribuiu mais para a redução do endividamento do que o superávit primário (economia feita para o pagamento de juros da dívida).
No primeiro semestre de 2013, a alta do dólar, de 12,1%, ajudou a reduzir a dívida líquida em 1,7 ponto percentual. Já a contribuição do resultado primário para a conta foi de 1,2 ponto. O estoque é hoje de 34,08% do Produto Interno Bruto (PIB). A elevação da moeda americana tem impacto po-sitivo na dívida, porque o Brasil tem reservas internacionais elevadas, superiores a US$ 370 bi-Ihões. Quando o dólar sobe, as reservas se valorizam e acabam aumentando os ativos do governo.
Segundo o economista Felipe Salto, da consultoria Tendências, os dados do BC deixam claro que a equipe econômica vem obtendo mais avanços na dívida por uma situação conjuntural. Ele lembra que o governo continua com uma política fiscal expansionista, aumento nos gastos e superávit primário abaixo da meta. Em 12 meses fechados em julho, o esforço fiscal ficou em 1,9% do PIB — a meta é 3,1%. A equipe já adiantou, porém, que só realizará um superávit de 2,3% do PIB, pois as receitas estão fracas e as despesas altas.
— Não há o que comemorar. O governo vem tendo a sorte de o câmbio estar ajudando a reduzir a dívida pública. A política fiscal tem ajudado
pouco — diz Salto.
O economista da Tendências lembra que, até abril, a trajetória da dívida estava praticamente estável, chegando a ter leve alta entre janeiro e fevereiro, de 35,16% para 35,66% do PIB. No entanto, diante das turbulências no mercado e da elevação do dólar, a dívida começou a cair mais fortemente. Salto estima que cada 10% de valorização do dólar tem impacto de um ponto percentual na dívida.
Para o economista-chefe do banco Votorantim, Roberto Padovani, mesmo com a trajetória de queda mais forte na dívida por conta do câmbio, o mercado está atento à forma como o govemo vem conduzindo a política fiscal. Por isso, a equipe econômica precisa deixar claro que está comprometida com a redução dos gastos públicos. Até julho, as despesas com pessoal, por exemplo, subiram 8,2% sobre 2012, enquanto o custeio cresceu 25%.
O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, destaca que o câmbio ajudou a reduzir a dívida em agosto. Embora o dado oficial ainda não tenha sido divulgado pelo BC, a variação cambial no mês foi de 16,1%, o que significa que, mesmo mantendo o atual nível do primário, a relação dívida/PIB deve cair de 1,1 a 1,5 ponto percentual no ano.
— Esse efeito positivo é temporário, pois há uma condição conjuntural da economia e não estrutural, além de ser motivada por fatores exógenos sobre os quais o govemo não tem controle. Já a gestão das despesas é fator estrutural, pois tem base no orçamento, é variável endógena, que o govemo tem o controle. Portanto, muito mais eficiente e de garantia de longo prazo, caso a execução da política fiscal austera tenha consistência.
TESOURO: DÍVDA ESTÁ EQUILIBRADA
Segundo os economistas, o govemo também considera o fato de que o mercado está mais atento ao comportamento da dívida bruta da União do que ao comportamento da dívida líquida. Número que reúne os débitos interno e externo dos governos federal, estaduais e municipais, a dívida bruta é um dos principais indicadores de solvência de um país. No Brasil, esse estoque vem crescendo por conta de emissões de títulos públicos para capitalizar bancos públicos e também para gerar dividendos que ajudem a reforçar as receitas da União.
Para o secretário do Tesouro, Amo Augustin, a dívida bmta está equilibrada. Para ele, a política de emitir títulos para capitalizar os bancos públicos, como o BNDES, é válida por estimular o investimento e o crescimento da economia. Segundo Augustin, os investidores não acham o mercado brasileiro arriscado, pois continuam buscando papéis do govemo com taxas de remuneração bem mais baixas que no passado.
Fonte: O Globo