Li na VEJA que o Dicionário de Idéias Feitas, do escritor Gustave Laubert, autor de Madame Bovary, tinha o propósito de zombar dos clichês de seu tempo – como, por exemplo, a idéia de que a calvície era sinal de inteligência. A matéria também registra que a época atual, como o século XIX, possui seus lugares-comuns e que se Flaubert vivesse hoje poderia fazer uma nova edição, tendo como tema um mal dos tempos atuais: – o das idéias paralisantes que, supervalorizadas pelo bombardeio da mídia, se transformam em falsas unanimidades, atrapalhando a vida das nações e dos indivíduos. Uma dessas idéias é a de que “O Brasil nunca será um país justo e desenvolvido, se não fizer uma reforma agrária”. Ao contradizer o dito, a revista lembra que, quando a economia se baseava na agricultura e a população era majoritariamente rural, o conceito era válido, ao contrário de hoje, quando a economia tem perfil industrial, a produção agrícola está mecanizada e 85% dos cidadãos vivem em cidades. Para um outro clichê, o de que “a violência no Brasil não é um problema de polícia. É antes de tudo uma questão social”, a publicação sustenta que é possível, sim, diminuir a violência antes de resolver os problemas sociais, que demandam tempo. E lembra que Bogotá, na Colômbia, reduziu drasticamente seu índice de assassinatos por cem mil habitantes, apenas aparelhando melhor a polícia e integrando-a na comunidade. O país, além de padecer da moléstia das idéias anacrônicas, foi infectado pelo vírus das pragas paralisantes. Uma delas surgiu de Pelé, que, se em campo foi de um virtuosismo inigualável, na condição de “figura pública”, às vezes, “pisa na bola”, igual a qualquer “perna-de-pau”, como no desabafo de que “o brasileiro não sabe votar”. Eleger “Cacarecos”, Jurunas e os Enéas não é a regra. São exceções e não se constituem num privilégio brasileiro. O Buch não se reelegeu nos EUA? “Quem estava com a razão era o De Gaulle quando disse que o Brasil não é um país sério!”. Não adiantam os desmentidos de que a frase foi proferida em Paris, em 62, por Carlos Alberto de Souza, embaixador brasileiro na França, em controversas circunstâncias. É melhor acreditar que foi o ex-presidente francês, em visita ao Brasil, quem a pronunciou. É a praga de se confiar na versão e não no fato. “Todo político é corrupto! “Taí” uma inverdade que andei inclinado em acreditar. Explico: um dos meus ícones da política era o senador Ibsen Pinheiro, presidente da Câmara Federal, quando do julgamento do impedimento de Fernando Collor. Julgava-o, como a outros, exemplo de postura, competência e probidade. Mas, após o impeachment, a Veja expôs indícios de ligações do senador com os “anões do orçamento” que o levaram a ser cassado. Se o Ibsen é corrupto, o que pensar dos demais?Onze anos após a verdade apareceu. Era falsa a denúncia da presença de US$1 milhão em depósitos na conta do político. O valor era US$1mil. A revista alega “erro de dolarização”. Que “errinho”, heim? Engano que levou Ibsen, à época, forte candidato à presidente, a contentar-se em ocupar, atualmente, uma cadeira de vereador no sul. “Este país não tem jeito!”. Esta é praga de madrinha! No entanto, permito-me a repassar ao governo, a receita de um soro caseiro, que quando aplicado corretamente, pode se transformar em antídoto a esses males paralisantes: percorra todo o país e recolha do solo as pragas aí de cima, assim como, ervas daninhas do tipo “Deus é conterrâneo” e o tal do “jeitinho brasileiro”. Reserve. A seguir, prepare exemplos explícitos de honestidade, compromisso, respeito e justiça em todos os níveis. Logo após, polvilhe à gosto, com lições de lealdade. Bata tudo junto e depois, acrescente demonstrações de patriotismo, civismo, civilidade, urbanidade e cidadania. Não espere esfriar. Aplique vacinações em massa. E ainda quente reforce com doses imunizadoras os recalcitrantes. E depois? Depois? Depois, é só correr para o abraço! Com direito a soco no ar e tudo!
Inicial RECEITA DE BRASIL