LEGIÃO ESTRANGEIRA

    A trajetória de Gislaine Ferreira para chegar na passarela das concorrentes ao título de Miss Universo deste ano, apresentou características peculiares. Representando sua cidade natal, Gislaine chegou em segundo lugar na eleição para Miss Minas Gerais. Inexistindo restrições, foi convidada para desfilar por Tocantins que não possuía representante e ganhou a disputa nacional. Ao contrário do que seria razoável, a Miss Brasil 2003, não representa a sua cidade natal e nem tampouco o seu estado de origem. E quando a gente pensa que regulamentos estranhos são produtos genuinamente brasileiros, chegam notícias de Santo Domingo que, para estes jogos Pan Americanos, as regras de procedência dos atletas foram tão relaxadas que o que está acontecendo por lá, é uma quase repetição do acontecido no concurso de Miss Brasil de 2003. Antes de entrar propriamente no assunto, que é o “estrangeirismo” presente neste Pan, confesso que o ápice das minhas emoções nestes jogos foi provocado por um argentino. Emocionadíssimo foi como assisti Fernando Meligeni, enrolado na bandeira brasileira, receber possivelmente a sua última medalha. A vitória obtida pelo “gringo” mais brasileiro que já vi (amável, “raçudo” e brincalhão) foi de justiça incomparável: ganhou do chileno Rios, adversário que sempre lhe foi superior tecnicamente e assinou em ouro a sua despedida. Disfarçadamente, comemorei como ele, curtindo – literalmente – um “chorinho”.        Entretanto, tenho sérias dúvidas se os 55 atletas estrangeiros que estampam em seus uniformes as letras USA possuem o mesmo amor escrito na testa de Fernando Meligeni pelo país que adotou em 1993 e no qual vive desde os quatro anos de idade. Esse contingente forma um grupo maior do que a delegação de vários países que participam do Pan e desempenharam até agora um papel fundamental para a liderança americana na competição. Das mais de 170 medalhas dos EUA, 24 foram conquistadas por atletas nascidos em outros países, aí incluídas 14 de ouro. Levando-se em conta apenas as medalhas que conquistaram em competições individuais, esses “estrangeiros” americanos estariam em sexto lugar no quadro de medalhas, à frente da Argentina.Para as disputas do tênis de mesa, além da Argentina e do Canadá, também os EUA e a República Dominicana, que fizeram uma final “chinesa” da modalidade, “importaram” atletas da China. As finalistas sequer  arranham o inglês ou o espanhol.          O “estrangeirismo” pode ter tirado do Brasil uma medalha de ouro: artilheiro da competição com 33 gols, o brasileiro Tony Azevedo é o principal jogador da equipe de pólo aquático dos Estados Unidos, que esmagou de forma inapelável os adversários, inclusive o Brasil, na grande decisão. A história seria a mesma se Tony tivesse defendido a sua pátria? Mesmo em menor escala o fenômeno atinge outros países. O Brasil inscreveu sete “estrangeiros”. Conquistaram quatro medalhas. Uma delas, a prata no pentatlo, foi ganha pela americana Samantha Harvey, naturalizada brasileira em 2000. No Pan de 1999, representou os EUA. Samantha migrou para as cores verde-amarelo depois de problemas com dirigentes da Federação americana em relação aos jogos de Sydney.   A presença de estrangeiros competindo por países diferentes do seu, possui o mesmo despropósito dos profissionais “senhores da guerra” que servem na Legião Estrangeira lutando pela nação que melhor paga. Representa um meio bastante discutível – no entanto, lícito – de se ganhar a vida. Solo, bandeira e patriotismo são meros detalhes.Se o vírus do estrangeirismo não for isolado, estará formalizada o que em Santo Domingo não passou de apenas mais uma trapalhada dominicana, tão comum nestes últimos jogos: um atleta cubano receber medalha ao som do hino norte-americano.        

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